Adicional de Penosidade: da ausência de regulamentação à possibilidade do pagamento

A Constituição Federal, ao dispor a respeito dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, assegurou expressamente em seu art. 7º, inciso XXIII, a percepção de “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei”.

Assim, o adicional de penosidade, tal como os mais conhecidos adicionais de insalubridade e periculosidade, visa remunerar o trabalhador por uma condição adversa a que este é exposto no curso do seu contrato de trabalho. Nesse sentido, o adicional de penosidade, em específico, visaria recompensar o trabalhador que se dedica à realização de um trabalho tido como penoso, ou seja, aquele que causa incômodo e fadiga, que demanda esforço físico em demasia ou mesmo que acarreta uma exaustão física ou psíquica acentuada, aliás, tão comum na atualidade em que episódios depressivos e estados de estresse causados pelo trabalho são crescentes.

Contudo, diferentemente do que ocorre com os adicionais de insalubridade e periculosidade, os quais encontram previsão expressa na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e em Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Previdência Social (NR 15 e 16), o adicional de penosidade ainda não foi regulamentado por Lei, embora existam diversos Projetos de Lei em trâmite perante o Congresso Nacional, como, por exemplo, o PL 9341/2017, de autoria do Deputado Chico Lopes.

E, como dito acima, a Constituição Federal, ao prever os adicionais para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, impõe que o respectivo adicional será devido “na forma da lei”. Assim, a aplicação do adicional de penosidade depende de uma regulamentação que estabeleça as condições de incidência, valores e demais critérios para o seu pagamento, sem a qual, portanto, não estariam as empresas obrigadas ao seu pagamento.

Vale ressaltar, contudo, que parte da doutrina trabalhista contemporânea entende que a efetividade do adicional de penosidade deve ocorrer independentemente da regulamentação da matéria em Lei, bastando, portanto, a previsão do artigo 7º, inciso XXIII, da Constituição Federal e o disposto no artigo 8º da CLT, segundo o qual, na falta de disposições legais ou contratuais, as autoridades em matéria trabalhista decidirão por analogia, por equidade e outros princípios e normas de direito. Porém, ao menos por enquanto, não se tem colhido decisões do Tribunal Superior do Trabalho avalizando tal entendimento.

Portanto, seguindo o entendimento doutrinário e jurisprudencial prevalecentes, não havendo tal regulamentação da matéria em Lei até o momento, o mencionado adicional somente se mostra devido quando as partes assim o ajustarem, seja por meio de previsão em contrato, em norma interna da empresa ou em negociação coletiva, segundo as condições de incidência e valores que entenderem razoáveis.

A Eletrobrás – Centrais Elétricas Brasileiras S/A, por exemplo, firmou Acordo Coletivo de Trabalho com a Federação Nacional dos Urbanitários, que vigorou em 2019/2020, prevendo a concessão de adicional de penosidade para os empregados que se ativavam em turnos ininterruptos de revezamento, no percentual de 7,5% calculado sobre o salário base acrescido do adicional por tempo de serviço. Nesse caso, convencionou-se que o trabalho em turno ininterrupto de revezamento, que por alternar os horários de trabalho nas três fases do dia impõe um maior sacrifício ao trabalhador e à saúde deste, daria ensejo ao referido adicional de penosidade.

E, conquanto as empresas possam convencionar a respeito do pagamento do adicional de penosidade nos termos acima mencionados, até que seja a matéria devidamente regulamentada, é importante estarem atentas a algumas questões, máxime porque, em se tratando de condição voltada para a proteção à saúde e segurança do trabalho, esta goza de uma maior proteção.

A CLT, embora não regulamente o adicional em questão, dispõe em seu artigo 611-B, incluído pela Lei 13.467/2017, ser ilícita a supressão ou a redução do adicional de remuneração para as atividades penosas por meio norma coletiva, donde, caso a matéria venha a ser objeto de futura regulamentação, a negociação coletiva encontrará limites neste particular. Outrossim, uma vez instituído tal adicional por liberalidade do empregador, ou seja, em contrato de trabalho ou norma interna, de modo que venha a aderir ao contrato de trabalho do empregado, não poderá este ser posteriormente suprimido pelo empregador de forma unilateral, salvo, naturalmente, se o trabalhador não mais se sujeitar àquelas condições de trabalho que ensejaram o pagamento do adicional.

Ademais, há que se ter em mente que, conquanto a teor da previsão contida no artigo 193, §2º da CLT, seja vedada a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, essa regra, segundo entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, não se aplica ao adicional de penosidade. Isto quer dizer que, caso o empregado receba o adicional de penosidade, isto não obsta que a empresa esteja obrigada ao pagamento do adicional de insalubridade ou periculosidade, eventualmente, previsto em Lei para a sua atividade empresária.

Portanto, apesar da inércia legislativa a respeito da matéria, vê-se que há meios de o empregador e as entidades sindicais tornarem efetivos os direitos sociais garantidos pela Constituição Federal aos trabalhadores que desenvolvem atividades penosas, bastando, para tanto, o ajuste individual ou coletivo instituindo o pagamento do respectivo adicional e as condições em que isso ocorrerá.

Manucci Advogados

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