Deepfake, cuja origem da palavra parte dos conceitos deep learning (conhecimento profundo) e fake (falso), trata-se de um mecanismo capaz de criar/recriar pessoas, vozes e imagens a partir do uso de inteligência artificial.
Os deepfakes ficaram universalmente conhecidos em 2017, quando a plataforma Reddit divulgou clipes pornográficos feitos com imagens de celebridades como Gal Gadot, Taylor Swift e Scarlett Johansson.
Desde então, a febre dos deepfakes ganhou contornos cada vez mais populares e muito se tem discutido sobre a sua aplicação, sobretudo porque referidas obras comumente são relacionadas à cultura da disseminação da desinformação, também conhecida como “fake news”.
Dessa forma, como as deepfakes normalmente envolvem a manipulação de conteúdo preexistente, como vídeos e imagens de pessoas reais, surge o seguinte questionamento: a Lei de Direitos Autorais (Lei n° 9.610/1998) está apta a proteger os criadores de tal conteúdo, sobretudo no que tange à titularidade das obras?
Primeiramente, é importante ressaltar que muito embora se atrele os deepfakes com a disseminação de fake news ou conteúdo ilícito, é necessário que essa percepção seja afastada, uma vez que as ferramentas tecnológicas implementadas nos deepfakes possuem diversas outras aplicabilidades e podem proporcionar, por exemplo, conteúdos mais interativos na área de educação, trazendo vida a personagens históricos, bem como na área da arte, promovendo maior acessibilidade por meio da criação de museus virtuais.
Por conseguinte, ao tentar se buscar a melhor classificação dos deepfakes na Lei de Direitos Autorais (Lei n° 9.610/1998), e consequentemente garantir legalidade e legitimidade para atuação dos produtores desse tipo de conteúdo, uma solução que pode ser aplicada é caracterizar os deepfakes como paródia, nos termos do artigo 47 da Lei de Direitos Autorais, o qual dispõe que “são livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito”.
Nessa perspectiva, os criadores das deepfakes devem se atentar para a limitação imposta pelo art. 79, §2° da Lei de Direitos Autorais (Lei n° 9.610/1998), o qual dispõe que, salvo expressa autorização do autor, é vedada a reprodução de obra fotográfica que não esteja em absoluta consonância com o original. Consequentemente, caso os produtores se utilizem de conteúdo que está em domínio público, não existe a limitação apresentada.
Logo, o produtor de deepfake, ao gerar uma nova obra através da aplicação de técnicas de manipulação criativa, obra essa que será classificada como obra derivada (art. 5°, VIII, “g” da Lei n° 9.610/1998), deverá receber a proteção aos direitos autorais, conferida pela Lei de Direitos Autorais (Lei n° 9.610/1998).
Todavia, mesmo que seja garantida a proteção às deepfakes, a forma como essas obras são registradas também leva a um outro dilema, visto que a rápida disseminação de informações pelas redes sociais atrapalha a comprovação da titularidade do conteúdo, e, consequentemente o próprio direito patrimonial sobre o bem.
Portanto, uma solução quanto a criação/proteção das deepfakes é o registro das obras por meio do Blockchain e os Non-fungible Tokens (NFTs), mecanismos capazes de registrar bens imateriais, como as deepfakes, a partir da criação de uma hash para o autor, dando a esse uma assinatura digital exclusiva sobre aquele conteúdo, possibilitando, inclusive, sua comercialização de forma mais segura.
Por fim, importante salientar que no Brasil existe o Projeto de Lei n° 2.338/2023, cujo objetivo é estabelecer normas gerais de caráter nacional sobre o uso de Inteligência Artificial. Conquanto, tal projeto não abrange a discussão sobre direitos autorais e propriedade intelectual/patrimonial sobre os conteúdos criados com o uso de IA, mas tão somente regula a responsabilidade civil do fornecedor ou operador de sistema artificial pelo dano que esse venha a causar a terceiro.
O Departamento Cível do Manucci Advogados se coloca à disposição de seus clientes, parceiros e demais interessados para maiores esclarecimentos.
Autores: Luiza Galantini e Iury Nascimento