A Lei do Distrato – Impactos e sua recente aplicação

Sancionada em dezembro de 2018, a Lei 13.786/18, também conhecida como ‘Lei do Distrato’, trouxe significativas mudanças nos procedimentos de rescisão contratual em instrumentos de Promessa de Compra e Venda de Unidades Autônomas, regidas pelas Leis Federais nº 4.591/64 – Das Incorporações Imobiliárias e nº 6.766/79 – Do Parcelamento do Solo Urbano.

Dentre as principais mudanças, pode-se destacar o aumento da multa contratual especificamente para os casos em que o adquirente desista da aquisição do imóvel ainda na planta, no percentual de 50% (cinquenta por cento) em empreendimentos que estejam em regime de patrimônio de afetação. Ou seja, naquela hipótese em que o incorporador é obrigado a manter as receitas referentes ao empreendimento em conta específica, segregada das demais atividades até o valor suficiente para conclusão das obras, situação na qual é assegurado ao adquirente da unidade a propriedade da unidade e o término da obra em caso de falência da construtora.

Nestes casos, havendo a rescisão, os valores deverão ser devolvidos em até 30 (trinta) dias após o habite-se.

Para os empreendimentos não submetidos ao regime do patrimônio de afetação a multa fica limitada em 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor pago, devendo ser quitada em até 180 (cento e oitenta) dias, contados da data do distrato.

Restou fixado na ‘Lei do Distrato’, ainda, o prazo de carência de 180 (cento e oitenta) dias para entrega da obra, após a data prevista para sua conclusão, sem multa ou motivo para rescisão contratual, na hipótese de existir cláusula acordada entre as partes. O que significa que havendo atraso na conclusão, mas ocorrendo dentro do prazo acima previsto, não poderá o comprador requerer a resolução do contrato, e, tampouco, terá o incorporador a obrigação de pagar qualquer valor a título de multa/ indenização.

Transcorrido esse prazo, caberá ao adquirente optar pela rescisão contratual, sendo-lhe assegurado a devolução de todos os valores pagos devidamente corrigidos no prazo de 60 (sessenta dias) após o distrato, ou a continuidade do contrato. Nessa hipótese, será devido ao comprador uma indenização no percentual de 1% (um por cento) sobre o valor pago à incorporadora, por cada mês que ultrapassar o prazo fixado para conclusão da obra.

Também estabelece a nova Lei do Distrato que todos os contratos devem conter “quadro resumo” com as principais informações da contratação, tais como: o valor do imóvel; condições de pagamento; valor da corretagem; índices de correção monetária; taxas de juros; e as consequências em caso de distrato, dentre outros.

A ausência deste quadro resumo constitui, inclusive, justa causa para a rescisão contratual por parte do adquirente.

Trouxe, ainda, a possibilidade do exercício do direito de arrependimento, facultando ao adquirente que firmar contrato em estandes de vendas e fora da sede do incorporador rescindir o contrato, durante o prazo improrrogável de 7 (sete) dias, com a devolução de todos os valores eventualmente antecipados, inclusive a comissão de corretagem.

Em regra, a nova Lei do Distrato será aplicada aos contratos firmados após a sua vigência, 28/12/2018. Contudo, já é possível verificar a sua aplicação imediata, como ocorreu no julgamento na 4ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP, que deu provimento ao recurso reformando sentença que havia julgado procedente a Ação Civil Pública da Associação Paulista de Consumidores contra incorporadora (autos n.º 1010259-32.2013.8.26.0309).

No caso em espeque, o juízo a quo havia determinado que os contratos futuros de compromissos de compra e venda deveriam constar expressamente que a retenção sobre as parcelas pagas seria limitada a 25% (vinte e cinco por cento), sem nenhum outro acréscimo ou a qualquer título, devendo a devolução ser feita em 30 (trinta) dias, de uma só vez.

Em seu voto, o relator entendeu que a retenção de 50% (cinquenta por cento) do montante pago, em caso de rescisão contratual, não afronta o ordenamento jurídico vigente, em razão do disposto na legislação específica.

Entrementes, no último dia 28 de março, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos recursos repetitivos (REsp 1.498.484 e REsp 1.635.428; REsp 1.614.721 e REsp 1.631.485), decidiu que não poderão ser aplicados os dispositivos da Lei 13.786/2018, em contratos firmados antes da vigência desta.

Nos termos da decisão do Ministro Luis Felipe Salomão, não é possível a modificação de entendimento jurisprudencial em processos pendentes de julgamento, mesmo com a posterior mudança normativa, em razão do princípio da irretroatividade da lei.

Dra. Renata Chacara – Advogada do Manucci Advogados, especializada em Direito de Empresa.


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